Livro 12 - 2020

"O Gesto que Fazemos para proteger a Cabeça" - Ana Margarida de Carvalho.

Foi-me oferecido no Natal e quis guardá-lo para ler na Ilha porque sei de antemão que a autora -  dona de um estilo próprio de quem domina com mestria a língua portuguesa - escreve romances que requerem tempo, esforço e concentração. É livro da Ilha. 
Quis porém as circunstâncias atuais que o lesse agora. Fiz mal. Mas pronto, não se chora em leite derramado. 
Este livro, que tem apenas uma frase por capitulo, é difícil de ler e senti nalguns momentos que perdia o fio à meada. O livro vive muito da escrita da autora, da estética, da escolha das palavras, das imagens e figuras de estilos, das frases que são só uma, dos pensamentos contínuos, quase febris, sem início ou fim, dos diálogos das mulheres em que não vês rostos mas vozes sem saber quem fala ou quem responde, das histórias de várias personagens que vivem num Alentejo ventoso e outras num Alentejo húmido na década de 30. Pelo meio ou paralela ou perpendicularmente, não sei, temos duas personagens, principais talvez, cada uma do seu sítio: Simão e Constantino. 
Depois há coisas muito peculiares, como as formigas que são referidas inúmeras vezes. Bichos que são um só, um a seguir ao outro e dão uma volta ao mundo. Nunca sabes quando começam ou acabam, como as frases do livro. Sim, às vezes, perdi o pé nesse enredo cadenciado.
Gostei muito do livro, da(s) estória(s). A escritora elaborou uma teia com a qualidade da sua escrita e do seu estilo e eu fiquei presa por lá. Tem um talento incrível para grandes romances. 

[Ide ler  o "Não se pode viver nos olhos de um gato" dela também e aguentem o primeiro parágrafo. Descobrirão um clássico da literatura portuguesa e personagens que viverão anos convosco.]

Dei-lhe 4,5 e recomendo. Se querem ler algo diferente e magistralmente bem escrito, não hesitem. Mas têm de escolher um tempo certo para o ler. 
(Não dou 5 porque tive de fazer pausas por causa do cansaço provocado pela leitura contínua, sem pausas, quase sem respirar.)
E a capa? Linda.


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