2023

2023... 

[Não me ocorre grande coisa a dizer sobre 2023 porque foi um ano normal, daqueles que vivemos sem sobressaltos ou euforias.

Ou este post é mera falta de inspiração. Nunca saberemos.]

Há sempre coisas que arrreliam ou preocupam, mas não me recordo delas ou melhor, não chegam para fazer o meu 2023. Houve coisas boas, mas que somando, não fazem a totalidade de 2023. Há 3 ou 4 coisas a dizer talvez. 

As minhas duas idas para Coimbra para me despedir da minha avó,  que não reconheci no leito da morte. Senti a Morte a rondar-lhe a cama. A minha avó viva com a morte a crescer dentro dela. Impressionou-me muito. Mais do que o falecimento dela. Teve uma morte lenta, sem monitorizações, fazendo jus ao estilo de vida que teve outrora. Uma pessoa que nasceu em 1925 teve um ritmo de vida e de morte  diferente do nosso, mais lento. No segundo que antecedeu a sua morte, o que terá pensado? Sentiu que partia? Lembrou-se dos filhos ? Dos netos? De mim, em particular? Estas são as perguntas às quais volto sistematicamente e que nunca terão respostas. 

O meu filho Pedro atravessou um período particularmente difícil. Sentiu-se sozinho e isolado. Teve de lidar com momentos de gozo e humilhação por parte de três palermas da turma, que deixaram mossas profundas na forma como se passou a relacionar com a escola, a turma e até à própria forma de se vestir. Quando partilhou connosco o que estava a acontecer, e demorou (demasiado) tempo a fazê-lo, consegiu, aos poucos, lidar com as coisas e resolvê-las. Assim o espero. Veremos em 2024. 

2023 foi o ano, definitivamente, em que os meus filhos nos deixaram. Já não vão connosco "dar uma volta", a não ser que haja promessa de comida num sitio xpto. Quando vão, até se divertem, mas nunca querem ir. O Pedro tem um grupo de amigos fora da escola, claro, com quem se dá muito e prefere estar com eles do que connosco. O Tiago prefere ficar em casa e jogar PS. Embora não queiram ir connosco, querem sempre que vá ver os jogos de futsal. E vou, nem que seja para ver o meu mais novo,  guarda-redes do meu coração,  a marcar golos e dedicá-los à namorada que está na bancada. 2023 foi aprender a lidar com as namoradas dele. [Suspiros].

Em janeiro de 2023, aconteceu uma coisa que nunca pensei fazer e que me envergonhou durante muito tempo. Continuava a ser seguida por causa da infeção do meu fígado e por causa de valores de anemia muito baixos. Fiz medicação, mas por causa do fígado,  tive de interromper e a médica avisou-me que devia introduzir carne na minha vida. Qu'horror! Era como dizer a um comunista que tinha de votar no che*a (há palavrões que não uso no meu blog. Entendem, certo?). O pai cá de casa estava irritado comigo. Chegou a enviar cenas da net de pessoas que estavam a ser internadas para receber ferro na veia ou muito doentes por se recusarem a comer carne. Chegou a fazer uma certa chantagem psicológica. "E não pensas nos teus filhos?" . Não foi assim, mas foi algo parecido. Um dia, disse que ia comer carne. Ele preparou a refeição toda, mas na hora H, não fui capaz. Parecia que estava a trair um ideal,  os animais e a mim própria. Ia ser fake. 15 dias depois, e porque estava cada vez mais cansada, voltei a dizer que era dessa. Ele fez um mega almoço de carne. Havia um silêncio ensurdecedor à mesa. Eu comi carne e ninguém falava com medo que largasse os talheres, que fugisse ou, pior, que chorasse! Foi o Tiago a perguntar, ao fim de alguns minutos, se estava a gostar (e recebeu logo um safanão do pai cá de casa debaixo da mesa!). Ri-me e disse a verdade. A carne é deliciosa. Fiz-lhes prometer que não contavam a ninguém, que era segredo nosso. Contei ao meu pai em março,  a caminho de Coimbra para ver a avó, e ele ficou tão feliz que queria ir à Mealhada comer leitão! Só contei aos amigos e colegas mais próximos depois disso e a Carolina foi a última a saber, tanto era a vergonha. Foi no 25 de abril. Depois disso nunca mais me lembrei de estar ou não a comer carne. São mais os dias em que não me lembro que não a comi durante 10 anos. 

2023 foi a vida a ter momentos normais, nem "uau, que espetáculo!" nem "ui, que inferno!". 2023 foi novamente um rio tranquilo, sem tempestades ou secas. O Verão, a ilha de Armona, os livros, o desporto em lume brando, mas ao qual quero voltar em força em 2024, a genealogia, uma garrafa de vinho aberta ao fim de semana, o sexo, os filhos, o pai cá de casa, os (poucos) amigos, a aldeia, Sesimbra, o futsal dos miúdos e os meus gatos são o salero que dá cor aos dias que se sucedem uns a seguir aos outros. Que seja sempre assim.



Comentários

Filomena disse…
gostei da tua descrição, foi um bom ano, parece-me