Lara

Na passada sexta-feira, a gata cá de casa, a Lara, caiu do 5°andar. Saí de casa à noite para acompanhar a minha amiga ao hospital e não me tinha percebido da coisa. No sábado de manhã,  enquanto estava ainda no hospital, os miúdos ligaram-me a dizer que a gata tinha desaparecido. Aflitos. Confesso que pensei que estava escondida num canto da casa. Toda a gente sabe que as crianças e os homens nunca vêem nada... Não sei grande importância. 
Percebi pelo tom, algumas horas depois, que a coisa era séria.  A minha amiga no hospital também era uma coisa séria.  Não conseguia processar grande coisa. Cheguei a casa às 17h. Estava tudo  desesperado. Eu estava um caco. Tinha passado quase 24 horas nas urgências com uma doente oncológica e tinha de ir à procura da Lara. Andei à procura na rua, meia tonta, sem saber como se procura uma gata. Regresso a casa e da janela das traseiras,  vejo a bicha perto de uma escola primária. Voltamos ao sítio mas nada de a ver. 
Domingo de eleições, às 7h00 da manhã, estava já eu na escola primária com uma transportadora para a apanhar. Entrei na escola com a autorização de uma funcionária mas daí a nada, um senhor muito pouco empático conduz-me quase à força para fora do estabelceimento. Foi tão agressivo nas palavras e gestos, que desatei a chorar,  gritando meia louca "chame a polícia,  que eu não saio". Vá, não foi assim tão à letra mas foi à mesma ideia...com muitas lágrimas. Detesto confrontos, ainda mais quando estou de rastos, física e emocionalmente. 
Colamos panfletos na rua,  partilhamos em mil grupos o desparecimento da Lara.
Arranjamos uma armadilha para gatos. Apanhei vários mas nenhuma Lara. Houve um dia em que fui buscar a armadilha às 22h30 com o Pedro, escuro como breu. O miúdo grita "apanhamos a Lara, apanhamos a Lara. Tem a orelha cortada, é a Lara". Ó meninas, vi que era cinzento, coloquei uma manta em cima da gaiola e levei para casa. Que felicidade. Em casa, um balde de água fria, não era  a Lara. Houve lágrimas, claro.
Entretanto, passei as tardes e noites na rua. Constipei-me e fiquei uma tarde de cama com febre. 
 Falei com toda a gente do bairro, com as cuidadoras das várias colónias, com todos os seres humanos que se cruzavam comigo. Era abordada na rua "é a senhora da gata?".
Vi a Lara mais duas vezes ao longe: no terraço dos vizinhos, que não estão em casa há uma semana e sem mais nemhum acesso para lá chegar ou na árvore em frente à minha casa. 
Todos os dias acordei a pensar onde tinha dormida a bicha, ela que sempre dormiu com os meus filhos, na cama. 

Hoje à noite, uma senhora tocou a porta. Encontrou a Lara debaixo de um carro. Chamou pelo nome dela e a gata segiu-a até ao nosso prédio. (Já vos disse que toda a gente me conhece e que falei com toda a gente?) . A senhora tocou a dizer que tinha a Lara. 
Nem acredito ainda.
Está magra e assustada. Já comeu imenso. Mas está cá,  connosco, onde pertence.
Hoje saiu-nos a sorte grande. Mesmo.

Comentários

Anónimo disse…
Tive um gato, há uns anos, que esteve desaparecido 11 dias. Já o dava como perdido, morto. Já tinha chorado quase tudo. Apareceu em casa dos vizinhos, que tinham estado de férias essa tempo todo. Até hoje, não sei como é que ele sobreviveu tanto tempo sem água e sem comida. Têm mesmo sete vidas...
Ainda bem que ela voltou.