Porque amanhã o Tiago faz 3 anos
Escrevi este relato no dia 10 de Novembro de 2007. Está nos Devaneios. Está agora também aqui. Ainda hoje, ao reler a segunda parte, choro. Quase que nem me lembrava o quanto custou.
Regresso aos nossos devaneios, diferente, mais confiante mais "mulher-valente"...Quem diria? Todas aquelas ansiedades diminuíram. É quase mágico: abracadabra e pronto! Mas vamos pôr ordem neste devaneio... há tanta coisa a dizer, tanta coisa que quero que fique registado para não me esquecer...
As contracções que eu não senti, apesar de estar em trabalho de parto, foram um caso quase de estudo dos médicos e enfermeiros. Miguel e eu na box da sala de parto a rir a parva, a tirar fotos, enquanto se ouvia gritos de mulheres e de bebés a respirar pela primeira vez. Até que me transferiram para a sala de dilatação onde fiquei sozinha durante algum tempo. Muito? Pouco? Não sei. Deram-me um calmante ou qualquer coisa assim para acelerar o parto e que me deixou completamente dopada. A minha médica induziu-me o parto e rebentou-me o saco. A água quente fez-me lembrar uma panela de sopa a ferver! A partir desse momento, senti as contracções e só me lembrava das aulas de preparação de parto: respiração e auto-controle. Deixaram que o Miguel estivesse comigo. Foi bom. Respirou comigo e avisava-me da intensidade das contracções. Foi-se embora e não me lembro de mais nada, a não ser da minha médica a perguntar se queria epidural. Claro! Mas tinha só de esperar masi algum tempo. Chegou a enfermeira Margarida e disse-me "está de 9 dedos de dilatação" e eufórica disse-me "o seu bebé está a nascer". Qual auto-controle, qual quê...eu queria a minha epidural e comecei a dizer que não, que não ia nascer sem a milagrosa ajuda. Até a minha médica teve de chamar-me à razão...não dava tempo.´Ainda me lembro da enfermeira dizer "ela esteve a dormir...fiz-lhe vários toques e não sentiu nada". Voltei a apagar. Quando acordei, estava em pleno trabalho de parto, com o meu Miguel a ajudar-me, a dizer-me que eu era valente, forte. Disse também várias vezes que me amava. Estava tão dopada que só me lembro de certos episódios: do enfermeiro Miguel me perguntar donde eu era e eu a responder de Corroios em França, de soltar um "foda-se" e do pessoal rir-se comigo e eu a dar uma de pudica "peço desculpa, eu que nunca digo palavrões...peço desculpa...olha que baixo nível o meu...". Deles dizerem "o seu bebé está a nascer, faça força" e eu sem vontade de fazer força e também com medo de doer... a descontrolar-me um pouco porque sabia que sem epidural ia sentir tudo até que pensei "ó pá, se tenho de fazer força, vamos a isso...". Fiz muita força, tal como me ensinaram. O Miguel diz que não sabe onde fui buscar força porque aguentei-me bem. Mas não me custou. Acho eu.Não me lembro bem.
O Tiago acordou. Vou dar mama.
Já volto
Tella
Nasceu o Tiago com 50 cm e 3,450 Kg. Não me apercebi bem que ele tinha nascido quando o meteram em cima de mim. Não reagi. O Miguel é que repetia "ó o nosso bebé" e eu lá lhe toquei sem saber muito bem o que fazer e sentir. Fiz-lhe festas. Os enfermeiros tiraram-no e entregaram-no ao pai. Sei que tirámos uma foto e apaguei por completo. Sei agora que Miguel tirou muitas fotos e fez um vídeo com ele. Tem mesmo jeito. Estava feliz. Ouvi ao longe uma enfermeira dizer: "ele está a ficar com frio, vou levá-lo". Acordei imediatamente para ver a cara da mulher que ia levar o meu filho e perguntei-lhe o nome. Tinha de saber. Os sinais todos em alerta. Lembro-me de ter pensado: "sinais todos em alerta...já..." Depois disso, o enfermeiro Miguel continuou a coser-me. Foram duas horas. Fui acordando e fui falando com ele de tudo: da sua vida, do filho dele de 3 anos, da sua escolha em obstetrícia, do novo filme do Michael Moore, da situação da saúde cá, dos hospitais particulares, da minha profissão... um amor, um doce. Quando me levaram para o recobro, fiquei triste porque não me tinha despedido do enfermeiro, lá pedi aos colegas para chamar por ele porque tinha de dizer obrigada e adeus. Assim foi e toda a gente achou estranho a minha atitude. Depois , o meu Tiago nos braços, o enfermeiro a po-lo na minha mama e o Tiago a mamar pela primeira vez. Foi lindo. O enfermeiro sempre ao meu lado a fazer-me festinhas na teste. Não sei se ele é assim para todas, mas senti que estávamos ligados... não sei porquê... Depois disso, um mau-estar, os vómitos, a crise de rins e a hemorragia... Sangue até mais não... O pessoal medico ao meu redor a carregar na barriga, uma dores horríveis e a jorrar cada vez mais sangue. O Dr Rui (outro amor) a perguntar pelo cateter da epidural para ter mais um reforço. Mas claro, nada. Eu gemia de dores e quando o médico me pressionava a barriga, eu agarrei nas mãos dele para ele parar. Apercebi-me que tinham de levar-me para uma outra sala e que iam fazer não sei o quê, isso depois de fazerem uma ecografia. E percebi que não ia levar anestesia, não havia tempo. Entrei em pânico: "ó sr. dr., tive um parto sem epidural, estou cansada e dorida, quero anestesia." A implorar. Eles nada. Levaram para a dita sala. Grande, fria, toda branca e por cima de mim, umas luzes, ao género dos laboratórios dos "others" no Lost. Só me lembrava disso. Um outro enfermeiro, o Jorge, agarrou-me na mão. À minha volta, algumas pessoas. Eu ligada à máquina onde ouvia o bip...bip...bip do meu coração e na minha cabeça (ou mesmo na realidade), ouvia a pulsação era cada vez mais espaçada. Tive medo. Houve uma altura que disse ao Jorge "estou-me a ir" e efectivamente, pensei que estava a deixar-me ir num sono profundo, quase a desmaiar. Quando perguntei ao outro enfermeiro, o José, se estava bem. Este foi sincero e respondeu "vamos ver". Parvo, eu queria que ele tivesse mentido! O Dr Rui, à minha frente, no meio das minhas pernas, com uma máscara de protecção, tipo aquelas dos metalúrgicos...O sangue não parava de jorrar. Enfiou mãos, e mais não sei o quê e tive de gritar e dizer "está-me a partir ao meio". Lá fizeram o que tinham a fazer e pronto. Perdi muito sangue. Estava exausta. Disse-lhes que agora achava que era uma grande mulher. O Jorge disse-me que sim, que era verdade. Também disse que tinha vontade de chorar porque era uma maria-chorona. Então chore. Foi a resposta que tive. Mas nem consegui. Nem para isso tinha força. Fiquei depois largas horas no recobro sem o Tiago. O enfermeiro Miguel vinha ter comigo imensas vezes e tratava-me sempre por "minha professora de francês preferida". Até me penteou e pôs o gancho verde que tinha levado. "uma mamã tem de estar sempre bonita."
E pronto, pouco mais há a dizer. Eu lembrei-me do Miguel e da aflição dele e pedi para alguém ir falar. O José já tinha ido tratar disso. O meu Tiago nasceu às 2h00 da manhã e eu só me tiraram do recobro para o meu quarto ao meio-dia.
Logo depois, chegou o meu Miguel. Quando o vi é que chorei. Chorei, chorei e chorei agarrado a ele. Ele queria ver o Tiago, eu sei, mas tinha de estar ali, nos braços dele. Sentir que era verdade. Que estava ali comigo. Depois disso, fiquei bem.
As contracções que eu não senti, apesar de estar em trabalho de parto, foram um caso quase de estudo dos médicos e enfermeiros. Miguel e eu na box da sala de parto a rir a parva, a tirar fotos, enquanto se ouvia gritos de mulheres e de bebés a respirar pela primeira vez. Até que me transferiram para a sala de dilatação onde fiquei sozinha durante algum tempo. Muito? Pouco? Não sei. Deram-me um calmante ou qualquer coisa assim para acelerar o parto e que me deixou completamente dopada. A minha médica induziu-me o parto e rebentou-me o saco. A água quente fez-me lembrar uma panela de sopa a ferver! A partir desse momento, senti as contracções e só me lembrava das aulas de preparação de parto: respiração e auto-controle. Deixaram que o Miguel estivesse comigo. Foi bom. Respirou comigo e avisava-me da intensidade das contracções. Foi-se embora e não me lembro de mais nada, a não ser da minha médica a perguntar se queria epidural. Claro! Mas tinha só de esperar masi algum tempo. Chegou a enfermeira Margarida e disse-me "está de 9 dedos de dilatação" e eufórica disse-me "o seu bebé está a nascer". Qual auto-controle, qual quê...eu queria a minha epidural e comecei a dizer que não, que não ia nascer sem a milagrosa ajuda. Até a minha médica teve de chamar-me à razão...não dava tempo.´Ainda me lembro da enfermeira dizer "ela esteve a dormir...fiz-lhe vários toques e não sentiu nada". Voltei a apagar. Quando acordei, estava em pleno trabalho de parto, com o meu Miguel a ajudar-me, a dizer-me que eu era valente, forte. Disse também várias vezes que me amava. Estava tão dopada que só me lembro de certos episódios: do enfermeiro Miguel me perguntar donde eu era e eu a responder de Corroios em França, de soltar um "foda-se" e do pessoal rir-se comigo e eu a dar uma de pudica "peço desculpa, eu que nunca digo palavrões...peço desculpa...olha que baixo nível o meu...". Deles dizerem "o seu bebé está a nascer, faça força" e eu sem vontade de fazer força e também com medo de doer... a descontrolar-me um pouco porque sabia que sem epidural ia sentir tudo até que pensei "ó pá, se tenho de fazer força, vamos a isso...". Fiz muita força, tal como me ensinaram. O Miguel diz que não sabe onde fui buscar força porque aguentei-me bem. Mas não me custou. Acho eu.Não me lembro bem.
O Tiago acordou. Vou dar mama.
Já volto
Tella
Nasceu o Tiago com 50 cm e 3,450 Kg. Não me apercebi bem que ele tinha nascido quando o meteram em cima de mim. Não reagi. O Miguel é que repetia "ó o nosso bebé" e eu lá lhe toquei sem saber muito bem o que fazer e sentir. Fiz-lhe festas. Os enfermeiros tiraram-no e entregaram-no ao pai. Sei que tirámos uma foto e apaguei por completo. Sei agora que Miguel tirou muitas fotos e fez um vídeo com ele. Tem mesmo jeito. Estava feliz. Ouvi ao longe uma enfermeira dizer: "ele está a ficar com frio, vou levá-lo". Acordei imediatamente para ver a cara da mulher que ia levar o meu filho e perguntei-lhe o nome. Tinha de saber. Os sinais todos em alerta. Lembro-me de ter pensado: "sinais todos em alerta...já..." Depois disso, o enfermeiro Miguel continuou a coser-me. Foram duas horas. Fui acordando e fui falando com ele de tudo: da sua vida, do filho dele de 3 anos, da sua escolha em obstetrícia, do novo filme do Michael Moore, da situação da saúde cá, dos hospitais particulares, da minha profissão... um amor, um doce. Quando me levaram para o recobro, fiquei triste porque não me tinha despedido do enfermeiro, lá pedi aos colegas para chamar por ele porque tinha de dizer obrigada e adeus. Assim foi e toda a gente achou estranho a minha atitude. Depois , o meu Tiago nos braços, o enfermeiro a po-lo na minha mama e o Tiago a mamar pela primeira vez. Foi lindo. O enfermeiro sempre ao meu lado a fazer-me festinhas na teste. Não sei se ele é assim para todas, mas senti que estávamos ligados... não sei porquê... Depois disso, um mau-estar, os vómitos, a crise de rins e a hemorragia... Sangue até mais não... O pessoal medico ao meu redor a carregar na barriga, uma dores horríveis e a jorrar cada vez mais sangue. O Dr Rui (outro amor) a perguntar pelo cateter da epidural para ter mais um reforço. Mas claro, nada. Eu gemia de dores e quando o médico me pressionava a barriga, eu agarrei nas mãos dele para ele parar. Apercebi-me que tinham de levar-me para uma outra sala e que iam fazer não sei o quê, isso depois de fazerem uma ecografia. E percebi que não ia levar anestesia, não havia tempo. Entrei em pânico: "ó sr. dr., tive um parto sem epidural, estou cansada e dorida, quero anestesia." A implorar. Eles nada. Levaram para a dita sala. Grande, fria, toda branca e por cima de mim, umas luzes, ao género dos laboratórios dos "others" no Lost. Só me lembrava disso. Um outro enfermeiro, o Jorge, agarrou-me na mão. À minha volta, algumas pessoas. Eu ligada à máquina onde ouvia o bip...bip...bip do meu coração e na minha cabeça (ou mesmo na realidade), ouvia a pulsação era cada vez mais espaçada. Tive medo. Houve uma altura que disse ao Jorge "estou-me a ir" e efectivamente, pensei que estava a deixar-me ir num sono profundo, quase a desmaiar. Quando perguntei ao outro enfermeiro, o José, se estava bem. Este foi sincero e respondeu "vamos ver". Parvo, eu queria que ele tivesse mentido! O Dr Rui, à minha frente, no meio das minhas pernas, com uma máscara de protecção, tipo aquelas dos metalúrgicos...O sangue não parava de jorrar. Enfiou mãos, e mais não sei o quê e tive de gritar e dizer "está-me a partir ao meio". Lá fizeram o que tinham a fazer e pronto. Perdi muito sangue. Estava exausta. Disse-lhes que agora achava que era uma grande mulher. O Jorge disse-me que sim, que era verdade. Também disse que tinha vontade de chorar porque era uma maria-chorona. Então chore. Foi a resposta que tive. Mas nem consegui. Nem para isso tinha força. Fiquei depois largas horas no recobro sem o Tiago. O enfermeiro Miguel vinha ter comigo imensas vezes e tratava-me sempre por "minha professora de francês preferida". Até me penteou e pôs o gancho verde que tinha levado. "uma mamã tem de estar sempre bonita."
E pronto, pouco mais há a dizer. Eu lembrei-me do Miguel e da aflição dele e pedi para alguém ir falar. O José já tinha ido tratar disso. O meu Tiago nasceu às 2h00 da manhã e eu só me tiraram do recobro para o meu quarto ao meio-dia.
Comentários
Um beijinho muito grande para os 4, mas em especial hoje é para o Tiago. Vocês já fazem parte da minha vida e da Beatriz, mesmo sem vos conhecer... Estou uma lamechas hoje que nem imaginas... Já prevejo que hoje vou andar a choramingar pelos cantos...
Bjos
Como sabes li este relato há 3 anos atrás, mas hoje vejo-o de modo completamente diferente...
Lembro-me de na tua gravidez sentires imensas inseguranças, e como dizes no relato teres "medo da dor", coisa que hoje em dia não tem NADA a ver contigo! Agora apercebo-me de pormenores que na altura nem devo ter ligado, que durante o parto tinhas estado também meia dopada, que ficaste 10 horas até ir para o quarto, que ficaste imenso tempo sem o Tiago e sem o Miguel - coisas a que na altura nem dei importancia, mas que agora me deixaram de lágrimas nos olhos.
Não és a mesma pessoa de quando entraste no hospital nesse dia, mas eu também não sou a mesma de quando li este relato pela 1a vez.
E isso é bom, não achas?
Grande mulher!!!
E continua com essa força ...
Beijinhos
Bolas...
Um grande beijinho
Foste e és realmente uma mulher de coragem!
Um beijo enorme!
Como é que se vão esquecer da placenta, bolas...mas por momentos pensei que te tivesse acontecido a ti o que me aconteceu a mim neste parto. Que o útero não tivesse recolhido...
Foste muito forte e valente, passar por tudo assim sem anestesia. Parabéns.
Beijocas
E agora deixaste-me a chorar. Chorona sou eu Tella maria!!