"Isso dói tanto"

A Fifi morreu. Os miúdos ainda não sabem. Estão a dormir. Como é que lhes vou dizer? Se me fizerem perguntas sobre ela, digo a verdade ou minto e espero pelo fim do dia?

Felizmente, nunca passaram pela experiência de perder alguém próximo. Vão vivenciar a coisa através da morte da nossa gata. Como é que se diz a um filho que um membro próximo morreu? Desculpem se vos ofendo referindo-me a ela como alguém próximo. 

É que cá em casa, sem vergonha nenhuma, humanizamos os nossos animais. Dormem connosco, na cama. Descansam no sofá, como nós. Se necessário, comem ao nosso colo, à mesa. Na verdade só a Fifi é que o faz -que o fazia, perdão mas ainda não a sei escrever no passado. Gostamos dos nossos animais mais do que gostamos do vizinho do 6°andar, sem dúvida. O nosso amor não tem de ficar limitado aos humanos, só isso. Cá em casa somos 6 ou éramos 6. Todos com um espaço especial no coração uns dos outros. 

Por isso, hoje, estivemos, os meus filhos e eu, no hospital com a nossa Fifi durante 2 horas a fazer-lhe companhia nos últimos momentos de vida. Minha rica gata, que dor que foi vê-la assim: a respirar com muita dificuldade, com o olhar longe, muito longe de nós, alheada e sobretudo muito longe da Fifi de outrora. O Pedro chorou o tempo todo em silêncio, com a sua mão no seu corpo. O Tiago chorou de forma descontrolada até que disse que não aguentava mais estar ali e saiu. Estão agora os dois a dormir juntos numa cama de solteiro. Não conseguem suportar sozinhos tamanha tristeza. 

Entretanto o pai cá de casa e eu regressámos ao hospital. A Fifi estava já em sofrimento e decidimos pôr-lhe um fim.

A Fifi sempre teve uma ligação forte comigo e eu com ela. Só respondia à minha voz. Só se aninhava no meu pescoço para dormir, só se sentava no meu colo para comer, só se enroscava ao meu colo como um bebé. 

E dói muito, como disse há pouco o meu Tiago. É tudo muito triste e quase surreal.